segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Espírito do Guerreiro

( Para o nosso eterno amigo e capitão do Chora Rita, Valcir (In Memorian), que teve uma praça inaugurada em sua homenagem na cidade de Pains no dia 29/12/12)

A Professora da Escola Municipal da cidade de Pains entra na sala de aula, a agitação dos alunos ampliava o calor que fazia naquele verão do ano de 2092, lentamente a conversa dos alunos cessa quando a professora começa a falar :
- Eu quero que vocês conheçam a história da nossa cidade, por isso vocês farão um trabalho para mim. Cada um escolherá um local da cidade e explicará a história desse lugar.
Alguns alunos se sentiram motivados pela tarefa, outros se aborreceram e consideraram aquela tarefa chatíssima. Um dos alunos que mal prestou atenção na professora e que reclamou muito ao saber do conteúdo do trabalho escolar ao conversar com seus colegas no intervalo foi o adolescente Rodolfo. Ele era um garoto órfão que morava com uma tia e não tinha muitas referências na vida, a bagunça e as travessuras na escola eram o que dava sentido à sua vida. O único lugar aonde sentia que podia esquecer seus problemas de menino largado era na quadra de futsal durante o recreio. O seu estilo de jogo, porém, espelhava a sua situação de órfão meio abandonado, era extremamente individualista ao conduzir a bola e não ajudava muito os colegas de time na marcação, além disso só demonstrava algum ânimo quando se encontrava com a posse da bola. Por isso, apesar de possuir uma considerável habilidade futebolística sempre era escolhido por último, depois mesmo dos mais perebas da turma.
Ao chegar em casa naquele dia, teve vontade de fazer suas bagunças, jogar Playstation 25 e nem encostar nas coisas da escola, porém ele se lembrou daquele trabalho escolar chato e deu uma olhada no seu boletim digital bastante avermelhado, e pensou de maneira inédita que deveria se dedicar àquele trabalho. De maneira comodista, ele pensou em investigar a história da pequena praça do lado da sua casa, de fato até aquele dia ele não sabia nem o nome daquela praça aonde ele tinha vivido boa parte da sua infância. Resolveu começar pelo óbvio, se dirigindo até a praça para observar a placa que ele nunca tivera disposição de ler. A placa já estava bastante desgastada pelo decurso do tempo, mas ele conseguiu identificar o nome da praça, que resistia bravamente ao desgaste, enquanto os nomes dos administradores responsáveis pela praça na época da inauguração já estavam irreconhecíveis. Era a praça Valcir Farias Júnior.
Rodolfo só tinha aquele nome mas não tinha muitas pistas para começar a sua pesquisa, veio-lhe à mente a ideia de perguntar à pessoa mais velha da cidade, um dos poucos que eram vivos na época da inauguração, por obra do acaso ou do destino, o referido senhor passava pela praça com uma sacola de pães. Rodolfo explicou-lhe sobre a pesquisa e logo em seguida perguntou:
- O senhor sabe quem foi esse Valcir que dá nome a essa praça?
Aquela pergunta fez o velho abaixar a cabeça e olhar para o chão.
- Foi um jovem advogado que faleceu em um acidente aqui em Pains no ano de 2014, ou foi 2015 a não foi 2012, isso foi em 2012.
- O senhor pode me falar mais sobre isso?
- A maneira como ele morreu não importa, o que eu posso dizer é que o Valcir mudou para sempre o espírito de nossa cidade, a cidade se uniu para buscá-lo quando ele estava desaparecido de uma forma que nunca se tinha visto antes, parecia que todos fomos tomados por um espírito de luta e garra qua aqui não havia antes e eu posso dizer que ao longo da minha vida, depois do incidente com o Valcir, nossa cidade sempre se marcou pela União em torno de grandes causas e pela dedicação de todos à coletividade. Parece que de certa forma, o espírito do Valcir nos anima até hoje.
Rodolfo agora já muito interessado na história muito mais pelo personagem do que pela praça em si, queria descobrir mais sobre esse Valcir e todo esse impacto causado por ele na cidade de Pains.
- Aonde eu posso saber mais sobre o Valcir?
- Eu lembro do irmão dele que era um pouco mais jovem do que ele, Rodrigo se não me engano, não é ... Gustavo o nome dele. Não sei se ainda é vivo, mas você pode procurar a família dele, eles moravam em Contagem naquela época.
Rodolfo agradeceu e foi embora quase correndo, chegou em casa e começou a pesquisar na internet de seu iphone 80, não era muito difícil encontrar pessoas na internet, a era da tecnologia já havia substituído a era da privacidade há algum tempo. Rodolfo rapidamente localizou o número do vídeo fone atualizado dos familiares de Valcir em Contagem e como que tomado por uma vontade inédita de fazer alguma coisa produtiva tentou entrar em contato com algum familiar por vídeo fone, o aparelho chamou e rapidamente um senhor de uns 70 anos respondeu com algum estranhamento por não reconhecer aquele garoto que ligava:
- Quem é?
Rodolfo explicou quem era e qual era o motivo da ligação, o semblante do senhor mudou, agora ele era todo sorrisos, ao saber que o garoto ligava para pesquisar sobre a vida de seu tio. O Senhor explicou:
- Meu nome também é Valcir, assim como meu tio e meu avô. Eu sou filho do Gustavo, meu pai faleceu há alguns anos. Eu nasci depois da morte do meu tio, mas eu sei todas as histórias dele, meu pai me contou tudo, quase todo dia nós falávamos sobre ele, apesar da saudade que a família sempre sentiu, parecia que ele estava lá conosco quando meu pai me contava uma história do tio Valcir. Meu pai me contou a história de cada jogo que ele jogou ao lado meu tio no Chora Rita.
- Chora Rita?
- O Chora Rita era o time do tio Valcir e do meu pai na faculdade de direito da UFMG. Deixa eu te mostrar.
Valcir saiu da imagem e retornou 20 segundos depois com uma camisa emoldurada com várias mensagens e assinaturas.
- Essa é a camisa que eles usavam, pode-se dizer que essa foi a cereja do bolo da curta e bela vida do meu tio. o Chora Rita era tudo para ele, uma família, um símbolo de união e igualdade em um tempo desigual. Ser do Chora Rita era ser parte de algo maior do que os indivíduos que compunham o time. Olha esse vídeo do meu tio comandando o grito de guerra do Chora Rita.
O sobrinho dividiu a tela e mostrou um vídeo de seu tio à frente do Chora Rita demonstrando toda a sua garra e liderança. Valcir contou todas as histórias do Chora Rita, o primeiro título, os jogos jurídicos junto com os amigos, as inúmeras cervejas divididas com os companheiros de time. A História impressionou Rodolfo, que percebeu que Valcir amava a vida de maneira tão intensa, que viveu em poucos anos o que a maioria não vive em uma longa vida. O que de certa forma fazia Rodolfo ter um pouco de vergonha da vida sem sentido que ele levava.
O sobrinho mostrou também o discurso de orador que seu tio tinha proferido perante seus colegas do direito, professores e familiares. Nesse discurso Valcir demonstrava toda a sua inteligência e seu idealismo. Rodolfo percebeu que Valcir era um ser humano diferenciado que marcou muitas e muitas pessoas
Enfim, Rodolfo finalizou a ligação que havia durado por volta de duas horas, ele estava emocionado e bastante suado, ouvir aquelas histórias parecia ter ativado nele uma vontade de viver, de lutar, de não deixar nada ou ninguém ser um obstáculo para os objetivos nobres e pelos quais nós devemos lutar todos os dias.
O Espírito eterno de Valcir contagiou mais um...



"Penso que podemos aproveitar este momento de emoção, e dizer que estamos preparados para nos resguardar do vício do positivismo exacerbado. Não nos percamos no perigoso jogo de vaidades e petulância tão típicos do mundo jurídico. Sejamos imunes, aos conceitos e princípios frios, dissociados do verdadeiro Estado Democrático de Direito."
                                 Valcir ( trecho retirado do discurso de orador)

3 comentários:

  1. Muito emocionante! É uma sensação maravilhosa e saudosa ler, depois de quatro anos dessa ausência, uma homenagem tão sincera! Valcir Júnior, meu querido e protetor irmão mais velho jamais será esquecido nos nossos corações e pensamentos. Obrigada pela linda homenagem!

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  2. Muito emocionante! É uma sensação maravilhosa e saudosa ler, depois de quatro anos dessa ausência, uma homenagem tão sincera! Valcir Júnior, meu querido e protetor irmão mais velho jamais será esquecido nos nossos corações e pensamentos. Obrigada pela linda homenagem!

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