domingo, 3 de março de 2013

Dia D Lucrar

(Esse conto foi inspirado na música "The Longest Day" do Iron Maiden)


Um velho deitado em uma cama de hospital aguarda a visita da morte, em seu leito mais uma vez ele se lembra do inesquecível dia de 6 de Junho de 1944, um dia que viveu esses anos todos em sua memória, era como se todas as manhãs ele tivesse acordado naquele fatídico amanhecer em uma praia da Normandia...

A tropa se encontrava em um barco que mas parecia uma lata de sardinhas, ao lado, atrás, à frente, milhares de outros barcos como aquele, era como uma surreal "linha de produção" da morte, milhares e milhares de seres humanos sendo encaminhados ao seu destino final, O Sr. Henry Ford nunca imaginou que as suas ideias que revolucionaram o capitalismo seriam empregadas de tão sinistra maneira, a morte enlatada, indiferenciada, pasteurizada, sem personalidade, sem rosto, sem identidade. Todos que avançavam na linha de montagem da morte se encaminhavam para um fim idêntico, como se a Morte fosse a dona daquela empresa e estivesse aguardando ansiosamente pelos seus produtos com a foice em uma mão e o relógio na outra.

O velho que finalmente se preparava para encontrar seu destino após todos esses anos era, na época do dia D, um Capitão do exército americano, portanto, tinha a cruel tarefa de liderar homens, ou melhor, meninos, muitos nem sequer tinham sentido o calor de uma mulher, naquele dia liderá-los significava praticamente levá-los à Morte, que impacientemente aguardava os lucros daquele enorme empreendimento, quanto lucro, com certeza a Morte precisaria de aumentar seu capital para conseguir levar todas aquelas almas de uma só vez.

O Capitão era talvez 5 anos mais velho do que a sua tropa, tentava transparecer uma coragem e uma experiência que ainda não lhe pertenciam naquele estágio da vida, e com certeza ele não estava preparado para todo o impacto do que ele veria naquele dia. O dia amanheceu como se não houvesse manhã, a luz do sol era bloqueada pela fumaça dos barcos e das explosões causadas pelos projéteis de artilharia incessantes. Os projéteis se chocavam com o mar e causavam grandes ondas que faziam os barcos balançarem e os soldados vomitarem. Era apenas um teste de qualidade, a fim de preparar os produtos para o seu destino final...

Em sua mente ainda ecoava a mensagem do General Eisenhower, transmitida a todo o exército na véspera da invasão, uma mensagem que exortava os homens a serem corajosos para que fosse possível destruir os malignos nazistas. O jovem capitão, ao olhar para aqueles jovens amedrontados em seu barco, tinha dúvidas se o verdadeiro inimigo estava à sua frente ou se estava mesmo atrás deles, em seu próprio país, na forma dos ricaços que lucravam milhões com aquela guerra. A mensagem do General Eisenhower era muito nobre, muito bonita, mas se destinava a pobres coitados que deveriam jogar sua vida fora para que os interesses econômicos de milionários pudessem ser protegidos. No fundo, o Capitão sabia que eles não lutavam pela liberdade ou pela pátria, mas sim pela grana de poucos, e esse poucos não se responsabilizariam pelas mortes daqueles jovens. Era como se os grandes industriais e banqueiros americanos e ingleses tivessem assinado um contrato com a Dona Morte, trocavam almas por muita grana e influência...

Apesar de todas as suas dúvidas sobre os verdadeiros motivos daquela guerra, o capitão tentou liderar seus homens no desembarque na praia sangrenta da melhor forma possível, tentando cortar ao máximo os lucros que a Dona Morte aguardava ansiosamente. Ele fez o possível e o impossível para salvar seus homens, distribuiu morfina, estancou sangramentos, mandou os homens se abaixarem, tudo isso em baixo de saraivadas e mais saraivadas de chumbo quente. Não adiantou, por mais que ele tentasse, os homens que, se situavam covardemente longe do combate, tinham fornecido todos os instrumentos para que o empreendimento Morte S/A fosse um sucesso estrondoso. As balas chegavam zunindo e vinham como etiquetas, a selar o destino daqueles pobres jovens, que em breve seriam acondicionados em caixões e despachados ao seu destino final, para regozijo de Dona Morte e indiferença de seus aliados ricos, que estavam mais preocupados com a próxima grande venda de armamentos de guerra.

O Capitão sobreviveu ao Dia D e à Segunda Guerra Mundial, talvez a Dona Morte preferiu poupá-lo pois não desejava uma alma que suspeitasse de suas negociatas e de seus acordos secretos. Aquelas lembranças do dia mais longo da vida daquele velhinho pareciam ser o prelúdio do que estava por vir. Finalmente a Dona Morte, até porque o corpo do velho não aguentava mais, vinha a contragosto lhe buscar. Um tempo de Revolução se avizinhava nas empresas Morte S/A com a chegada daquela alma que sabia demais...